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Queime minha língua: a propaganda mais uma vez estava errada

Para queimar minha língua, mais uma salada de opinião sobre a formação do Brasil.

1. “A” Casas Bahia

Líder no projeto de implosão cultural da civilização brasileira, a rede de varejo Casas Bahia lança comerciais baseados no verso “Avisa lá” (da música axé) e opta por concordar o verbo não com pronomes de segunda pessoa (perdendo a chance de usar um tu direito), mas com “sua família”.

Seria o caso da velha campanha “contrate um revisor”? Parece que não adiantaria, parece de propósito.

2. A faixa de pedestres

O Brasil adora lançar costumes como se os estivesse inventando. O esforço civilizatório das autoridades no respeito às leis de trânsito tem ido como previsto: o povo aprende quando é multado, mas não adianta que lei muito comportada não pega.

Por isso o respeito à faixa é um símbolo tão flagrante de atraso. Morando no centro, tenho visto como o pedestre tem pouca disposição a esperar o sinal. Isso não surpreende, mas surpreende menos ainda o fato de que, apesar de existirem multas para o desrespeito ao pedestre, muitos veículos atropelem a faixa de cruzamento, mantendo viva a cultura de trânsito inseguro na cidade grande.

A prefeitura de São Paulo lança campanha de propaganda para o pedestre fazer sinal pedindo “por favor” para ser respeitado num direito óbvio.

Pensei que a regra não fosse essa. Por princípio, a arma de destruição de aço e gasolina deveria dar prioridade à carne e ao osso. O pedestre pisou na faixa, tem preferência; não era assim que a gente tinha aprendido, mesmo que não funcionasse? Não adianta eu pedir se o outro não me vir.

Por que a propaganda não sugere, ao contrário, que o motorista mande um abraço para o pedestre, sinalizando que pretende respeitar a norma? Talvez a conclusão tenha sido: quem anda a pé é pobre ou vagabundo, portanto seu tempo vale menos para a economia. Matemática interessante!

3. Contrate um editor

A segunda propaganda, por ser política, poderia ser mais útil. Nesse caso, no entanto, contratar um revisor não bastaria. Esse é mais um exemplo dos motivos que me fazem querer mudar nossa campanha de propaganda política para “contrate um editor”! Naquele caso, no entanto, o editor só faria diferença se seu engajamento fosse a favor do pedestre, não da máquina.

Felizmente editores tentam ser pessoas educadas, civilizadas. Estou certo de que nesses e em muitos outros casos trocar o lema “contrate um revisor” por “contrate um editor” vai funcionar bem. Afinal, qualquer editor que se preze vai querer ter por perto um revisor. Ou um redator. Ou um “redapórter”. Um estagiário que goste de Letras, talvez.