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A rede social

O camarada Sílvio sugeriu com veemência que o blog Alegoria Digital aderisse às ferramentas de compartilhamento da Internet. Agora temos uma na barra lateral deste blog.

Não espero que, de um dia para o outro, o efeito boca-a-boca projete o blog às alturas da audiência internética. Mas, se a organização em rede tem uma vantagem verdadeira, esta é a possibilidade de quebrar a hegemonia dos “formadores de opinião”. Isso já é bem sabido, sim, mas nem todos têm consciência de como o boca-a-boca impõe-se contra o direcionamento da propaganda comercial, contra o adestramento ideológico.

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Piada de cientista

Na penúltima sessão do 3º Congresso Internacional de Jornalismo Cultural, 20 de maio em São Paulo, Marcos Flamínio Peres conversou com Jon Lee Anderson sobre os riscos de o jornalista se envolver com suas fontes e, por outro lado, de se deixar influenciar pela academia.
Parece que o repórter internacional chama de “academia” até mesmo as notícias acumuladas sobre um assunto, no sentido de que estabelecem uma verdade sobre este lugar ou aquela personagem. É claro que o repórter vai responder que prefere ver o fato de perto a conhecer por livros ou entrevistas.
Ora, mas a academia faz a mesma coisa, dizendo que os jornalistas estão afetados por interesses, enquanto a pesquisa científica é pura de ideologia.
Já sabemos que a briga sobre quem “diz a verdade” vai longe, mas fiquei pensando sobre o lugar de profissionais como eu, circulando entre academia, jornalismo e arte. Há muitos interesses, modos de conceber o mundo, ideologias em jogo.

Cartum de S. Harris, em http://www.sciencecartoonsplus.com

Nessas horas pode valer a pena o socorro humorístico. Dois autores que vêm à cabeça, pela denúncia da pretensão acadêmica de apresentar a “verdade” absoluta, são Sidney Harris e Jorge Cham.
Tenho o livro A ciência ri, de Harris, coletânea de seus desenhos hilariantes.

Mas o que consumo com mais frequência é o sítio de Cham, Piled Higher and Deeper, com uma enorme base de dados de suas tirinhas sobre pós-graduação. Além de descrever o cotidiano acadêmico (projetos, bolsas e, notadamente, procrastinação), essa série faz muita mistura de códigos e estilos, com paródias da história da literatura e do desenho.
Sei que, para seguir o conselho de Anderson, não devo tomar essas ficções como verdade. Mas elas ajudam a gente a ver além do dito pelo noticiário, pelos artigos científicos, por artistas pretensiosos.

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Os bons homens

Alguns amigos de escola com quem mantenho contato até hoje conversaram comigo pela primeira vez numa festa de aniversário em 1990. Começava uma nova fase de nossas vidas, o ginásio. Talvez querendo exibir maturidade, atormentei os coleguinhas com máxima iniciadas com “o bom homem…”, das quais não me lembro nenhuma, mas certamente eram morais do tipo “o bom homem está sempre prevenido”.

Eu prometia escrever um livro sobre o bom homem.

Foi provavelmente em quadrinhos como esse que comecei a buscar uma fundamentação para o livro "O bom homem", projeto que não vingou.

Eu não conhecia filosofia. Não veio uma moral nem veio uma ética daí. Mas guardei essa anedota como presságio para, na faculdade de Filosofia, achar graça na proposta de estudar um autor estadunidense chamado Nelson Goodman.

O trabalho de Goodman como fonte de pesquisa surgiu como indicação do meu orientador na iniciação científica, Luiz Henrique Lopes dos Santos. Ele deve ter se divertido ao ver este jovem classificador penando para acompanhar o filósofo da linguagem, que usa uma metodologia carregada de lógica proposicional para falar sobre arte e ciência (e voluntariamente deixando a discussão ética para os outros).

Espantei-me quando, agora no mestrado, falando sobre essa experiência para meu atual orientador, Luís Carlos Petry, vi-o interessado em Goodman. Cumpri então o papel dos orientandos de levar bibliografia de um profesor a outro?

Aquele bom homem volta a se apresentar em meus escritos. A ideia goodmaniana de que um texto é uma “forma de fazer mundo” será um fundamento de minha exposição sobre o roteiro do jogo eletrônico Final Fantasy VII, no dia 27 de maio, no Gamepad.

Espero um dia participar de uma reunião com meus velhos colegas de ensino fundamental e levar a eles um livro sobre algum desses bons homens.

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A versão de mundo de Final Fantasy VII

27 de maio no IV Gamepad – Seminário de Games, Comunicação e Tecnologia

15h30, Sala 402 do prédio Azul

Campus II da Feevale – RS-239, 2755 Novo Hamburgo – RS

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Entrevista com Morin

Ficou bonita a edição de minha entrevista com Edgar Morin, na Cult de maio. Minha obscura sugestão de título, “Le Parkour de Morin”, foi substituída por “A estrela nômade” pela competente equipe da revista.
De qualquer modo a imagem desse pensador saltitando não me sai da cabeça. O que posso atestar sobre ele é que, mui diferentemente dos diretores de marketing acostumados às mesmas perguntas, dos professores receosos das intenções do repórter, diferentemente de muita gente que é entrevistada, esse senhor de 90 anos entendeu bem o que era perguntado e respondeu no assunto.
Apesar de reverenciado por muitos no Brasil, ele não é evidentemente unanimidade. Mas, se for seu adversário, será do tipo “meu melhor inimigo”.

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M. C. Escher, o sucesso

O M. C. do momento em São Paulo não faz “funk carioca”. Maurits Cornelis Escher (1898-1972) é o tema da exposição no Centro Cultural Banco do Brasil.

O gênio do ladrilhamento e das provocações de perspectiva tem sem dúvida apelo popular. Parafraseando o camarada Guilherme Chiapetta, “o mercado de tatuagens vai experimentar um ‘boom’ de Escher neste ano”.

Porém, nos feriados do mês passado, o sucesso deve ter ido um pouco além do planejado. Tentei visitar a mostra na sexta-feira, 22 de abril, mas as filas eram suficientemente desanimadoras. Os profissionais da organização pareciam despreparados para o público que acorreu maciçamente ao evento.

"Sonho" (1935)

(Nota metodológica: para o CCBB de São Paulo, filas de menos de dez minutos por andar são suficientes para lotar as escadarias e os espaços livres do edifício. É pouco na comparação com as chamadas “megaexposições”, no entanto o propósito deste texto é justamente refletir sobre o potencial popularizador do autor holandês. Mais de uma vez ouvi comentários sobre como uma tal exposição poderia ter sido instalada no amplo espaço da Oca, mas sabemos que esta curadoria não foi pensada para isso.)

Dei-me por satisfeito com a visita somente ao subsolo do CCBB, ciente da possibilidade de  ver o restante num dia de semana.

Num dia de semana, tive a oportunidade de divertir-me com jogos de espelhos e outras instalações baseadas na obra de Escher. Se não fossem uma equipe de televisão e duas excursões escolares, o ambiente estaria vazio.

Tiro duas conclusões óbvias:

  • Escher poderia suscitar grandes debates sobre os conceitos de autoria e reprodutibilidade (com seus autorretratos ao espelho, com seus padrões), sobre a arbitrariedade quanto a “que é arte” (se ele é “artista plástico” ou “artista gráfico”) e sobre a perspectiva como convenção (que ele desafia). Mas isso requer mais cuidado, mediação. Quiçá uma exposição maior?
  • Não recomendo a visita à mostra no feriado.

O Mundo Mágico de Escher
Terça a domingo, das 9h às 20h
No CCBB-SP, até 17 de julho

"Levar um boneco à exposição é coisa da década passada" (2011)